07 fevereiro, 2012

GESTÃO EDUCACIONAL E ESCOLAR: UM MAPEAMENTO E ALGUMAS QUESTÕES.


Autora: Tania Mara Tavares da Silva




O Antropólogo Geertz em um de seus ensaios ao tentar definir a compreensão da
cultura, utiliza, dentre outros exemplos o piscar dos olhos. Imaginemos que dois garotos
pisquem os olhos e que em um deles este movimento seja um tique nervoso e, no outro,
uma piscadela conspiratória. São dois movimentos idênticos, mas com significados
diferentes. Ambos são formalmente iguais, mas se quisermos compreendê-los, temos
que distinguir o piscar involuntário da piscadela que significa ação conspiratória.
Formalmente iguais, adquirem na teia das relações sociais dimensão e significados
muito diferentes. Podemos estabelecer uma relação entre o que afirma Geertz e a
questão dos modelos de gestão quando nos debruçamos sobre a literatura que trata o
tema, isto é, os textos produzidos no âmbito do Estado nos parecem formalmente
iguais aos que são produzidos por alguns educadores. Por outro lado, as vozes
dissonantes (os que se colocam em uma perspectiva crítica) são tão visceralmente
opostas que tememos como estar: “jogando o bebê fora com a água do banho”. Ou,
voltando a Geertz, estamos, no que se refere à gestão, em um momento importante para
que possamos distinguir os sentidos e os significados das piscadelas. Vale a ressalva que
o conceito de gestão é parte substantiva e inerente às novas formas de organizações
políticas e econômicas que hoje vivenciamos embora para alguns autores (e esta é a
crítica mais visceral ao neoliberalismo) trata-se de uma nova roupagem, a partir da qual
se dá no âmbito educacional e escolar uma possibilidade de se perpetuar o modelo
capitalista e não sua ruptura.


Mas a qual momento estamos fazendo referência? Para tanto antes de focar o
tema específico da gestão acreditamos ser necessário analisar o contexto no qual emerge
este conceito que tem como base teórica fundamental uma mudança de paradigma no
âmbito da educação, pois como indicado em alguns autores, o uso do conceito de
Gestão Educacional/Escolar como substituto ou sinônimo (não há consenso) de
Administração está relacionado a um contexto histórico determinado a que se
convencionou denominar neoliberalismo (ampliaremos sua compreensão mais adiante)
A influência do neoliberalismo na educação adquire contornos mais nítidos nas décadas
de 1980 e 1990, período que se propagam e se consolidam as Reformas Educacionais
consideradas necessárias para a preparação dos indivíduos para estes “novos tempos”.
Em síntese, diante das transformações a gestão educacional/escolar teria não apenas que
responder a novas demandas sociais, mas ao mesmo tempo preparar uma massa crítica

para responder aos novos desafios de maneira ativa.


Inicialmente iremos nos concentrar, ainda que de forma resumida, em mudanças
que consideramos centrais para o tema em foco fazendo a ressalva que existem outras
possíveis. Por exemplo, há uma vasta literatura que, a) debate se o contexto da
globalização é algo novo ou continuidade; b) estabelecem uma crítica ao fim do Estado
de Bem Estar Social e suas conseqüências para o âmbito da educação e c) debatem e
descrevem as influências e ingerências das agências internacionais como, por exemplo,
o Banco Mundial nas políticas dos denominados países periféricos. Ou seja, o tema da
globalização e a crítica ao neoliberalismo apresentam no campo da educação uma
vasta literatura crítica não só no Brasil como em outros países. Portanto, é quase
impossível dar conta da produção sobre o tema no seu conjunto sem incorrer em
esquecimentos. Assim, iremos, pois nos remeter a duas frases que espelham o período
que estamos vivendo e que consideramos centrais para a questão dos modelos de gestão.
As frases foram retiradas de dois autores. Um deles enfoca diretamente a
educação e outro indiretamente, pois trata do tema das novas relações dos sujeitos com
o mercado de trabalho. As frases lapidares são: Educar em Tempos Incertos (título de
um texto de Enguita) e “Não Há longo Prazo” (frase de um texto de Sennet intitulado A
Corrosão do Caráter).Acreditamos que estes dois pontos parecem suficientes para
contextualizar o contexto no qual emerge uma nova forma de gestão educacional
(lembremos que a escolarização está contida na educação que é um conceito mais

amplo) e, por conseguinte, a do gestor escolar.


“Educar em tempos incertos” e “não há longo prazo” se constituem no cenário
base, sob o qual deve agir a educação nos seus aspectos estruturais (a política; a
legislação e a gestão) seja esta pensada em nível macro (o Estado) ou no seu braço mais
efetivo, isto é, na prática escolar cotidiana que é a figura do gestor e sua relação com a
comunidade mais próxima, isto é, a que trabalha diretamente vinculada a escola e o seu
entorno: a comunidade. Iniciaremos com o trabalho de Enguita retomando uma idéia
que, para o autor, entrelaça definitivamente na sociedade capitalista, a educação, escola
e o mundo do trabalho.
Em um texto dos anos de 1980 Enguita, descrevendo, o surgimento da escola de
massas faz a seguinte afirmação: a burguesia com a dissolução dos laços de
dependência; a ruína dos artesãos dentre outras características, já havia conseguido que
a força de trabalho surgisse no mercado pelo seu valor de troca, mas ainda não havia
assegurado seu valor de uso e, para isto, era necessário criar a vontade no trabalhador. A
escola, embora não houvesse sido criada para tal fim, (o trabalho de Áries (1979) faz
um resumo minucioso da criação dos colégios e das escolas e sua aliança com a família
- ponto fundamental para a gestão educacional) estava lá e era considerado um
instrumento idôneo. Desde, então, a escola liga-se ao sistema capitalista particularmente
na sua relação com o mercado de trabalho.
Esta continuidade é reforçada por Enguita nos anos de 1990 quando então já
estamos diante do que se convencionou denominar terceira revolução industrial. E são
as características deste movimento de mudança na forma de produção aliado ao novo
papel do Estado (referimo-nos aqui a um dos aspectos centrais do neoliberalismo, isto é,
o fim do denominado estado de Bem Estar Social) que vão impulsionar novas
exigências para o âmbito escolar e sua transformação.
Em “Educar em Tempos Incertos” Enguita analisa as várias transformações da
sociedade que se refletem na escola e, para esta contextualização selecionamos suas
reflexões sobre a mudança social no sentido amplo; a mudança no mundo do trabalho e
no conceito de cidadania.
Um primeiro aspecto importante é aquele no qual o autor enfatiza que a crise do
sistema educacional deve-se a um movimento histórico fundamental, isto é, se em
períodos anteriores as mudanças davam-se entre gerações; hoje elas ocorrem na mesma
geração. Dito de outro modo: avós; pais e crianças convivem com as transformações e
de alguma forma devem adequar-se a ela. Como isto se traduz em uma nova visão de
escola e crise? Para Enguita rompe-se a velha sequência em que após o período escolar
seguia-se a entrada no mercado de trabalho. Hoje, é preciso aprender continuamente o
que exige que a escola se adapte aos novos ciclos de aprendizagem (não confundir com
os ciclos escolares propostos na LDB). Além disto, como a formação permanente é
valorizada, pode ser estabelecida na relação entre pais e escola algo muito diferente
dado que para alguns, o professor já não é mais o dono do saber tendo por consequência
também uma perda do seu status. Podemos reforçar esta perspectiva do autor, com pelo
menos dois exemplos da realidade brasileira: algumas alunas do curso de Pedagogia (no
qual fui coordenadora durante oito anos) muitas vezes afirmavam ter escolhido o curso
como uma forma de acompanhar seus filhos na escola; um outro exemplo vem de uma
reportagem sobre uma escola do estado do Rio de Janeiro. No texto destacou-se que os
pais afirmavam que atividades extra-escolares cansam sues filhos (Jornal Estado de São
Paulo 23/03/2009-1º caderno) embora esta prática tenha melhorado o rendimento dos
alunos. Ou seja, amplia-se a ingerência dos pais na escola algo que é, paradoxalmente,
desejado e repudiado ao mesmo tempo.
Um segundo ponto importante, é a mudança promovida pela globalização na
relação global local que, no caso do Brasileiro tem sido mais enfocado pela perspectiva
do multiculturalismo. Para não nos estendermos muito diremos que o fundamental
apontado por Enguita é que, cada vez mais a escola, que nos seus primórdios
preocupava-se com a construção de uma identidade nacional única (o exemplo clássico,
é o dos Estados Unidos descrito pelo próprio Enguita no texto de 1980 já citado) tem
agora que lidar no interior de uma mesma nação com culturas diferenciadas. Assim, em
uma sala de aula o professor pode se ver frente culturas cujos valores são muito
diferenciados. As saídas como aponta Enguita, seriam: a da aculturação (sobreposição
da nação sobre a cultura); a da tolerância, isto é, aceitar o outro sem compreendê-lo e
por fim a que ele advoga, isto é, que deve haver um esforço da escola: compreender o
outro e interagir com ele (ou, como afirmam os antropólogos “colocar-se no lugar do
outro”) E finaliza afirmando que esta visão incide diretamente na formação do professor
e, acrescentamos, também na do gestor educacional/ escolar. Mais adiante iremos
aprofundar esta idéia.
O último ponto que queremos ressaltar das idéias de Enguita é a questão das
mudanças no mercado de trabalho, ponto central da obra de Sennett que trataremos em
seguida. Afirma o autor que, no âmbito da economia capitalista a fonte de poder é a
propriedade, o que converte o empresário, em princípio, em autoridade suprema e
legítima da empresa como organização. O Estado, no entanto, insere-se em outra lógica.
Embora esteja sujeito à tendência autoritária de toda organização, encontra-se em um
campo de legitimidade e direitos onde todos os indivíduos são iguais. Em resumo: a
empresa desenvolve uma lógica autoritária, e o Estado uma lógica democrática, ainda
que nos dois casos possamos encontrar democracia na empresa e autoritarismo no
Estado. A expansão da educação ou, como afirma o autor, dos títulos escolares e
acadêmicos, findou por escapar de qualquer ajuste às necessidades do sistema
produtivo. Assim cria-se um paradoxo: quanto mais importância adquire a educação no
mercado de trabalho, mais se desvalorizam os títulos individuais, ou seja, cada vez mais
se necessita de um nível mais elevado para se ter acesso ao mercado de trabalho. E
finaliza este ponto tocando na questão da flexibilidade. Por um lado, a flexibilidade
externa que consiste em se ajustar continuamente às demandas do mercado e, por outro
uma flexibilidade interna que demanda a busca de novos mercados e produtos que exige
um trabalhador mais flexível, que desenvolva uma séria de aptidões que tanto podem ser
utilizadas na mesma empresa ou para a procura de novos empregos. Aqui encontramos a
frase de Sennett: “não há longo prazo”.
A preocupação de Sennett é a de demonstrar o quanto estas novas condições do
mundo do trabalho afetam as pessoas e o seu modo de vida. Toma, como exemplo
primordial, a história de Rico e Enrico, pai e filho que viveram ambos realidades muito
diferenciadas no mundo do trabalho. Tomaremos do trabalho de Sennett apenas o
capítulo sobre Flexibilidade por dois motivos: reforçar o que Enguita denomina como
crise na educação e, ao mesmo tempo, enfatizar aqueles que reafirmam ser este
movimento uma forma importante para se ocultar o sistema de poder que se esconde por
detrás do conceito de flexibilidade. Em primeiro lugar, afirma Sennett, há um sistema de
poder que se esconde nas modernas formas de flexibilidade e que consiste em três
elementos: reinvenção descontínua de instituições; especialização flexível de produção

e concentração de poder sem centralização.


A reinvenção descontínua de instituições pode ser traduzida na idéia de que o
ataque à rotina burocrática, busca reinventar as instituições, para que o presente se torne
descontínuo com o passado. Por exemplo, a troca das hierarquias piramidais pela idéia
de rede ou de ilhas de produção. Esta reengenharia organizacional, aliada às novas
tecnologias trouxe, por conseqüência, uma redução de empregos. Além disto,
contribuíram para que o moral e a produtividade do trabalhador caíssem
assustadoramente: por exemplo, os sobreviventes respiram aliviados por não terem sido
vítimas do golpe do machado. Mas, a flexibilidade se apóia em um motivo decisivo que
é a volatilidade da demanda do consumidor o que leva ao segundo elemento, a
especialização flexível, que possibilita responder rapidamente a demanda de produtos
variados no mercado. Enfatiza-se novamente a inovação e mudança e isto se traduz nas
modificações semanais e até diárias do que deve fazer o trabalhador. Além disto, e por
causa disto, exige respostas rápidas do trabalhador que deve ter as competências
adequadas para esta dinâmica.
Por fim, o último elemento, que tem relação direta com a gestão
educacional/escolar: concentração de poder sem centralização. Uma das afirmações a
favor é que esta nova organização que descentraliza o poder daria as pessoas que estão
nas categorias inferiores mais controle sobre suas atividades. Para o autor esta é uma
afirmação falsa já que os novos sistemas de informação deixam pouco espaço para os
indivíduos dado que o alto escalão tem controle sobre suas ações. Assim, nas modernas
organizações que praticam a concentração sem centralização, a dominação do alto é ao
mesmo tempo forte e informativa. Portanto, para Sennett, a capacidade de desprender-se
do próprio passado e a confiança para aceitar a fragmentação são dois traços de caráter
do novo capitalismo que encorajam a espontaneidade e, ao mesmo tempo, corroem o
caráter dos que tentam jogar segundo as mesmas regras.
As idéias de Enguita e Sennett aclaram o que enunciamos em princípio, isto é,
que não há muita diferença entre o discurso do Estado e de alguns educadores (sejam
eles de fora ou de dentro do Estado). No entanto, isto mascara e, por vezes cria a ilusão
de que não há controle e que vivemos em um momento de mudança de paradigma. Ou
seja, teríamos ultrapassado um modelo de gestão cujas bases teóricas são inversas ao
que hoje está proposto repito, tanto pelo Estado como por alguns educadores.
Embora existam denominações diversas o que parece ser consensual é que
ultrapassamos o modelo de gestão centralizado e que agora vivemos a implantação do
modelo democrático participativo. Portanto embora as denominações podem se
diferenciar dependendo da ótica do autor esta é uma oposição central que organiza a
forma da gestão educacional/escolar. O primeiro pertence ao que foi denominado como
Administrador Escolar e, o segundo, a do Gestor Educacional/Escolar dado a
incorporação na sociedade das instituições de educação não formal.
Sabemos que a pesquisa sobre a Administração Escolar remonta aos anos de
1930 quando a organização da educação no Brasil toma impulso com a presidência de
Vargas. Ao ler essas obras (embora possamos encontrar algum eco no que hoje falamos
sobre a gestão educacional/escolar) vemos que são, em sua maioria, marcadas por uma
concepção burocrática, funcionalista e muito próxima do modelo de organização da
empresa (como afirma Enguita dentre outros a empresa foi vista como modelo positivo
de organização desde os anos de 1920). Este modelo tem suas bases alicerçadas nas
idéias de Taylor que, sempre esteve preocupado com a seleção científica do operário
principalmente através da inspeção, do controle de tarefas e do redimensionamento do
tempo através da execução do mesmo trabalho em menos tempo. As palavras chaves
são o controle e inspeção realizados por um especialista (no âmbito educacional o
supervisor e o diretor cumprem este papel, além do coordenador pedagógico e/ou

orientador pedagógico, pois as denominações e atribuições diferem).


Este modelo transposto para a escola {que Libâneo (2008) denomina de
científico-racional} pressupõe uma concepção na qual prevalece uma visão mais
burocrática e tecnicista da educação e da escola. A escola é vista como realidade neutra
que deve funcionar racionalmente. Portanto suas tarefas podem ser planejadas,
organizadas e controladas de forma a melhorar seus índices de eficiência ou
produtividade. Os ambientes educacionais organizados a partir deste modelo colocam
um peso excessivo na estrutura da organização, valorizam a hierarquia das funções (o
diretor é autoridade máxima), as normas e regulamentos. E o que é primordial: a
participação é negada ou dada nos limites admitidos pelas normas. De acordo com
Libâneo este é o modelo que ainda prevalece na realidade educacional brasileira. Ou
seja, parece haver uma resistência à mudança mesmo entre os professores que não só
muitas vezes se recusam a participar, por exemplo, na construção do Projeto Político
Pedagógico da Escola como tem sérias dúvidas sobre a participação da comunidade
presente no entorno da escola. Assim, perpetua-se na prática escolar uma postura contra
a qual se colocam a atual política educacional (aqui vale novamente a ressalva que para
alguns autores, trata-se de uma nova roupagem e não de uma mudança efetiva), a
legislação e a teoria proposta pelos educadores que é o modelo democrático baseado em
uma concepção sócio crítica da educação.
É interessante notar que o encontrado na literatura também se constituiu como
minha realidade como gestora. Na minha experiência como coordenadora de um curso
de Pedagogia, tive o privilégio de conviver com diretores, professoras e professores da
educação básica. Constatei que esta resistência à transformação do cotidiano da escola
dava-se principalmente quando havia a proposta de participação através de projetos que,
em sua maioria, eram feitos como uma obrigação imposta pela diretoria de ensino. É
claro que para isto contribui a nossa política educacional que faz com que os professores
trabalhem em várias escolas e não consigam estabelecer nenhum vínculo com uma só
escola ou com a comunidade do seu entorno. Além disto, também podemos encontrar o
efeito perverso da compreensão da idéia de igualdade. Um bom exemplo (que
presenciei) foi o fato de muitas profissionais da Educação Infantil, chamarem as mães
de seus alunos apenas como “mãe” e quando indaguei o porque desta atitude, elas me
afirmaram que não sabiam o nome e colocavam como justificativa que esta era uma
forma de tratamento igualitário, isto é, a idéia de tratamento igualitário faz com que a
comunidade muitas vezes perca sua identidade como sujeito.
Assim, a transformação exige uma mudança radical na cultura organizacional da
escola e também na formação dos educadores que mesmo lendo uma literatura crítica
não conseguem reter e levar estas idéias para sua prática profissional. E aqui o papel do
gestor é fundamental. A gestão escolar está no campo da política e a escola reverbera e
reproduz, pelo menos em parte, as formas pelas quais a política opera na sociedade.
Assim, se o processo democrático é apenas formal ou muitas vezes imposto (o voto
obrigatório é um exemplo) como a escola poderá intentar ser de outra forma?
Acreditamos que um dos pontos fundamentais é a transformar a formação dos que
atuam na educação e pensar que este será um processo longo, ou como afirmaria
Gramsci trata-se de construir um movimento de contrahegemonia, isto é, contra a
hegemonia cultural que reitera a centralização do poder. A partir deste movimento
poderíamos quem sabe construir e consolidar a autonomia e participação como um novo
paradigma que se instaura na escola como realidade e não apenas como retórica. Em
síntese, as bases teóricas deste modelo de gestão são: a racionalidade técnica, a
centralização do poder, e, contraditoriamente, políticas que elaboram um discurso
descentralizador sem que se possa colocar em prática. Assim, o modelo de gestão
escolar adotado está baseado na combinação de formas de planejamento e controle
central na formulação das políticas associado a descentralização administrativa na
implementação destas políticas. Neste sentido, perdura a idéia de Taylor e Fayol de que
os trabalhadores são considerados insumos no processo de produção. No entanto, como
já mencionado, não é esta a proposta teórica do novo modelo de gestão que
encontramos na literatura. Defende-se hoje, um modelo de gestão democrático e
participativo como forma de modificar o âmbito educacional e honrar o compromisso de

Educar a Todos.


A gestão educacional/escolar participativa tende (como afirma Libâneo e outros)
a centrar suas bases teóricas na perspectiva sóciocrítica da educação. Assim, em
oposto a visão científico-racional a organização escolar não é vista como algo objetivo,
um espaço neutro a ser observado, mas e creio ser esta uma palavra chave, um espaço a
ser construído pela comunidade educativa, o que significa o envolvimento de
professores, alunos e pais. No que se refere especificamente ao papel do gestor ele deve
promover formas democráticas de gestão e tomadas de decisões. Ou seja, o processo de
gestão dá-se de forma coletiva e possibilita o debate público de projetos, ações e o
exercício de práticas colaborativas. Para que tal aconteça, faz-se necessário uma
mudança da política educacional e da própria visão (ou cultura) da ação docente. Por
um lado, ainda há uma diferença substantiva entre o salário dos gestores e dos
professores o que pode reforçar o status do diretor e por outro, muitos professores não
acreditam que suas vozes farão diferença e, portanto, podemos inferir que sua
autonomia começa e termina na sala de aula. Será que podemos pensar o mesmo da
própria autonomia do gestor frente aos órgãos superiores? Ou seja, será que já temos
suficiente tempo destas novas propostas para que o que se coloca na teoria possa se
realizar na prática? Estas são questões que me parecer ser substantivas em um debate
sobre gestão. Embora o educador tenha as palavras como arma para a transformação, é
preciso também levar em conta uma comparação efetiva entre o falar e o agir.
Acreditamos que, se o gestor educacional apenas afirmar que irá realizar uma gestão
participativa e suas ações neguem esta proposta, dificilmente ele conseguirá implantar

este novo paradigma de gestão.


Finalizamos com um exemplo prático do que considero ser um caminho possível
para a implantação de uma gestão participativa. Em primeiro lugar, acabar com a
hegemonia de um modelo único de pensamento ou como afirma Enguita respeitar as
diferenças (aqui teóricas) que trazem os professores e incorporá-las mesmo que não seja
a sua. Em segundo lugar prestar atenção nas tessituras do cotidiano da escola, isto é,
estar na sala dos professores; nas salas de aula tendo o cuidado de saber que
inicialmente os professores podem pensar em controle, mas aos poucos podemos com
nossas ações transformar esta idéia em visão de colaboração e, por fim prestar atenção
no que dizem os “corpos”, pois como afirmam os antropólogos o corpo expressa
sentimentos muitas vezes contraditórios com o discurso proferido. Assim podemos
fornecer aos futuros pedagogos gestores caminhos mais concretos do que a mera
repetição do que dizem os autores. Almejar a práxis (reflexão na ação) deve ser o
objetivo de um gestor que quer estabelecer em sua escola a autonomia de si mesmo e da
comunidade escolar e do entorno.


BIBLIOGRAFIA CITADA:
ARIÈS, P. História Social da Criança e da Família. Rio de Janeiro: Guanabara, 1979.
ENGUITA, F. M. A Face Oculta da Escola: Educação e Trabalho no Capitalismo.
Porto Alegre: Artes Médicas, 1989.(pp 105-131)
_______________Educar Em tempos Incertos. Porto Alegre: Artes Médicas, 2004.
LIBÂNEO J. C. Organização e Gestão da Escola - Teoria e Prática. Goiânia: MF
Livros, 2008 (5ª ed. Revista e Ampliada)
SENNETT, A Corrosão do Caráter: conseqüências pessoais do trabalho no novo
capitalismo. Rio de Janeiro: Record. 2001.